en-PARÂMETROS PARA OS PLANOS DE CONTINGÊNCIA PARA CATÁSTROFES EM INSTITUIÇÕES HOSPITALARES INTERNACIONAIS por alunos da licenciatura em enfermagem da ESSCVP.

Ana Luísa Silva
Beatriz Domingues
Inês Henriques
Willian Rosa
Alunos da Licenciatura em Enfermagem da ESSCVP (Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa), sob a orientação da Professora Ana Paula Nunes.
I. Resumo/ Abstract
No contexto da importância da elaboração de planos de contingência para desastres em instituições hospitalares, esta pesquisa tem como propósito identificar e sistematizar os pilares comuns que estruturam estes planos. Este objetivo é desenvolvido através de uma revisão narrativa da literatura, a partir de artigos pesquisados em bases de dados e apresentou como resultados três eixos fundamentais encontrados em todos os artigos selecionados: a liderança em planos de contingência em instituições hospitalares; a integração da comunidade nos planos de contingência; e as alterações nas instalações hospitalares e nas equipas de saúde.
A importância da sistematização destes pilares, é evidenciada pelo contexto de maior suscetibilidade em que o mundo se encontra, demonstrado pela recente pandemia de COVID-19, e pelo papel preponderante da enfermagem na elaboração, execução e aprimoramento dos planos de contingência em instituições hospitalares.
Palavras-chave: Catástrofes; Planos de contingência; Instituições hospitalares; Enfermagem.
II. Introdução
Os planos de contingência para catástrofes no âmbito da saúde, têm ganho cada vez mais relevância, devido ao aumento na frequência dos desastres ambientais causados pelos efeitos das alterações climáticas ou na recente pandemia que desafiou os sistemas de saúde a nível mundial.
O planeamento e a execução dos planos de contingência nas unidades de saúde, nomeadamente, nos hospitais, envolvem necessariamente equipas multidisciplinares da área da saúde. No entanto, é conhecido o papel na gestão e na liderança por parte dos enfermeiros nos serviços de saúde, quer seja por conhecerem bem o seu funcionamento, os doentes e as comunidades, quer seja pela atribuição inerente da sua formação e funções profissionais.
O objetivo geral delineado para o tema proposto, foi identificar e sistematizar pilares comuns que estruturam os planos de contingência para catástrofes em instituições hospitalares internacionais. Pretendemos com este trabalho, compreender se há e quais são os eixos comuns que estruturam estes planos, e como podem ser sistematizados. Este objetivo foi definido, tendo em conta uma revisão da literatura, que refere a ausência de padrões ou protocolos entre instituições hospitalares internacionais, como os mecanismos de troca de informações e as experiências, no sentido do aprimoramento destes planos.
A metodologia da pesquisa está enquadrada numa revisão narrativa da literatura sobre o tema abordado, para dar resposta à questão de partida: Quais os pilares comuns que estruturam os planos de contingência para catástrofes em instituições hospitalares internacionais?
A pesquisa é qualitativa e foram utilizadas como base de dados CINAHL e MEDLINE, através do motor de busca EBSCOhost. Os descritores utilizados foram "disasters", "disaster planning", "surge capacity" e "disaster preparedness".
Da pesquisa resultaram 29 artigos em inglês, filtrados através dos critérios de inclusão: texto integral sobre o tema e artigos publicados nos últimos 5 anos em português e/ou inglês; e, como critérios de exclusão: artigos sem acesso gratuito, artigos sem texto integral disponível e artigos não pertinentes para o tema em estudo. Foram selecionados 5 artigos que cumpriam os requisitos para dar resposta ao objetivo de sistematizar pilares comuns que estruturam os planos de contingência para catástrofes em instituições hospitalares internacionais.
Descreve-se e analisa-se neste artigo, os eixos comuns nos planos de contingência encontrados na literatura disponível, e refletiu-se sobre a importância do conteúdo analisado, bem como as suas ausências e limitações.
III. Desenvolvimento
III. 1. A importância da formulação de planos de contingência em instituições hospitalares
A preparação para desastres naturais e antropogénicos requer uma avaliação de risco por meio da análise da vulnerabilidade de perigo e a formulação de planos de contingência nas instituições hospitalares. As catástrofes geralmente exigem que ocorra uma passagem de operações convencionais para operações de contingência, para que se possa atender da melhor forma possível as necessidades da população. O planeamento do pré-desastre requer a modificação do espaço dedicado aos cuidados, ao nível dos recursos humanos e da logística, para que a execução do plano de contingência seja bem-sucedido durante uma catástrofe. Antecipar a procura por equipamentos para suprimir necessidades essenciais, é fundamental. Para tal, devem-se estabelecer cadeias capazes de sustentar operações em cenários de desastres prolongados.
Uma vez desenvolvido o plano, os principais fatores de implementação devem incluir: quando se deve dar início ao plano, quem pode ativá-lo e como deve ser realizada essa ativação, bem como, a forma como o plano será comunicado à equipa. A revisão do plano deve ser obrigatoriamente anual e deve conter sempre orientações e a reeducação de todos os elementos da equipa. Após a ativação do simulacro é fundamental manter a proximidade entre todos os elementos da equipa.
É fundamental a revisão regular do plano de contingência e o acompanhamento da eficácia do mesmo, realizando simulacros, uma vez que estes são essenciais para manter a relevância e a operacionalidade do plano ao longo do tempo. O treino e a prática por meio destes simulacros, ajudarão a identificar as limitações e a necessidade de introdução de melhorias.
Tais decisões são eticamente complexas e muitas vezes contrárias àquelas tomadas em circunstâncias do quotidiano. Há um dever de planear estas situações por meio do desenho de estruturas essenciais, como forma de orientar as decisões a serem tomadas em situação de crise.
O desenvolvimento de modelos hierárquicos de pessoal, ferramentas de educação suplementar e planos de suprimentos, podem evitar desafios antecipados antes de um desastre real.1
II. 2. A importância da liderança em planos de contingência em instituições hospitalar
A liderança em tempos de incerteza, como aquando da ocorrência de catástrofes, requer uma atuação assertiva que possa ser tomada como exemplo. A presença e a ação do líder deve ser firme e constante.
A literatura refere que os enfermeiros desempenham um papel significativo no fornecimento de orientações e no reforço de protocolos que incluem a gestão. Estas orientações podem fazer abrandar, interromper ou reverter os danos causados pela catástrofe. São estas orientações que fazem a diferença entre o sucesso e o fracasso da liderança numa situação de crise, e nas quais, geralmente reside a capacidade de o líder definir a direção a seguir, oferecer segurança e manter uma comunicação eficaz.
Os enfermeiros na posição de liderança devem garantir a colaboração e a cooperação entre as diferentes equipas e departamentos do hospital, através do estabelecimento de critérios eficazes que incluem:
- Visibilidade, especialmente durante o horário não administrativo;
- Disponibilidade 24 horas por dia, todos os dias da semana;
- Reconhecimento pela capacidade de resposta da sua equipa;
- Admiração pela capacidade da equipa de trabalhar sob grande stress e por todo o trabalho realizado;
- Competência para comunicar com a equipa com rapidez, clareza e regularidade;
- Positividade e tranquilidade perante um ambiente inóspito;
- Transparência para estabelecer confiança.
A capacidade e a vontade de responder a uma crise são fundamentais para os valores da enfermagem. Os líderes devem preparar a equipa para o futuro, construindo organizações mais fortes com base nas lições aprendidas, na reafirmação dos valores fundamentais para a saúde e no compromisso com a criatividade no atendimento ao doente e na defesa da equipa. 2
III. 3. A importância da integração da comunidade no plano de contingência
Prevenir e estar preparado para uma situação de catástrofe é fundamental e, muitas vezes, vital. É importante estar preparado para situações de catástrofe tanto em casa, como no trabalho, escola ou comunidade de modo a poder ajudar a controlar melhor a situação e a recuperar mais rapidamente, uma vez que em situação de catástrofe o socorro pode demorar mais tempo a chegar.
Devemos envolver as comunidades nos planos de contingência, com o objetivo de ajudá-las a reduzir a sua vulnerabilidade e a prepará-las para fazer frente a eventuais catástrofes ou situações de emergência críticas.3
A integração da população deve ser feita através da transmissão de informação de forma bidirecional entre as estruturas hospitalares, de apoio pré-hospitalar e a população.
A execução frequente de simulacros junto da população e a sua avaliação, permite identificar as falhas dos planos de contingência e melhorá-los.4
III. 4. As alterações nas instalações hospitalares e nas equipas de saúde
As situações de catástrofe podem ocorrer a qualquer momento, e podem ter implicações diretas na prestação de cuidados de saúde.
As instituições hospitalares de forma geral, encontram-se a trabalhar no limite máximo da sua capacidade, pelo que as complicações inerentes a um cenário de catástrofe podem comprometer o acesso aos cuidados de saúde necessários e em segurança. Existem alguns conceitos fundamentais para o planeamento e para uma melhor intervenção numa situação de catástrofe, nomeadamente:
- Identificação dos riscos e vulnerabilidades existentes;
- Tomada de consciência
por parte da comunidade e governo de que as situações
de catástrofe podem ocorrer; - Reconhecimento dos benefícios de um planeamento adequado;
- Criação de legislação que garanta a implementação de planos de contingência;
- Nomeação de uma organização que seja responsável pela
coordenação,
planeamento da resposta, mitigação e recuperação aquando de uma situação de catástrofe.
No que diz respeito à organização e gestão de um plano de contingência,
é
necessário ter presente questões como:
- Organização da estrutura de comando e coordenação, com a predefinição de um gabinete de crise;
- Procedimentos e responsabilidades para a ativação do plano de contingência;
- Estabelecimento das áreas de atendimento;
- Mobilização e evacuação de doentes;
- Reorganização e mobilização de recursos humanos;
- Circulação de informação entre a equipa multidisciplinar de saúde, com desenvolvimento de fichas e documentos;
A reorganização e adaptação dos espaços físicos é uma necessidade. Neste sentido, todas as instituições hospitalares devem ter:
- Espaços específicos para a triagem de situação de desastre/catástrofe;
- Salas para tratamentos;
- Sala de isolamento;
- Salas de espera;
- Camas suplementares;
- Sala de Gabinete de Crise;
- Circuitos de ambulâncias (entrada, remoção de doentes e saída);
- Espaço físico exclusivo a familiares e restante população;
- Espaço físico exclusivo aos meios de comunicação social;
- Áreas privadas para funcionários;
- Sala de acolhimento de voluntários e outros;
- Serviço de morgue.
Esta reorganização varia de acordo com cada instituição hospitalar, contudo, todas as medidas devem ter em conta uma redução tanto quanto possível dos riscos para os doentes e para os profissionais de saúde.
Também primordial para uma intervenção eficaz e eficiente em catástrofes, é a seleção, o conhecimento e a implementação dos métodos de triagem. Em Portugal, são utilizados dois métodos de triagem em situações de catástrofe: a primária e a secundária. A triagem primária, é a mais generalizada em todo o mundo, permitindo uma categorização rápida por nível de gravidade. Devido à sua simplicidade, permite uma triagem rápida de grande número de vítimas, utilizando apenas três discriminadores:
- Vítima anda? Ferida?
- Respira? Frequência respiratória?
- Frequência cardíaca?
Estes discriminadores, encontram-se associados aos fluxogramas, através dos quais é possível obter 4 categorias:
- Cor vermelha – Vítima emergente;
- Cor amarela – Vítima grave;
- Cor verde – Vítima não grave;
- Cor preta – Cadáver.
A triagem secundária, é baseada no método de triagem TRTS (Triage Revised Trauma Score), que consiste numa avaliação continua, baseada em três variáveis fisiológicas: frequência respiratória, estado de consciência, com a utilização de escala de coma de Glasgow e a avaliação da tensão arterial sistólica. A cada uma destas variáveis é atribuída uma pontuação entre 0 e 4. O resultado da soma das parcelas (0-12), determina a prioridade, sendo que, quanto maior for o valor, menor é a prioridade.4
IV. Conclusão
A elaboração deste artigo de revisão narrativa da literatura procurou apresentar o tema, parâmetros para os planos de contingência para catástrofes em instituições hospitalares internacionais e sua pertinência na atualidade. Pretendemos também analisar a importância da elaboração de planos de contingência em instituições hospitalares, compreender se existem pilares comuns que estruturam estes planos e, sobretudo, quais eram estes pilares.
Assim, pudemos verificar ao longo do desenvolvimento desta pesquisa, que foi possível cumprir o objetivo geral proposto inicialmente, uma vez que foram encontrados eixos comuns que oferecem parâmetros de orientação dos planos de contingência e para a ação das equipas de saúde nas instituições hospitalares internacionais em contexto de catástrofe.
Os pilares encontrados foram: a importância da liderança em planos de contingência em instituições hospitalares; a importância da integração da comunidade nos planos de contingência; e as alterações nas instalações hospitalares e nas equipas de saúde.
Nos artigos estudados estes três pilares foram abordados com centralidade, tendo-lhes sido atribuída a importância significativa no sucesso da implementação dos planos de contingência em instituições hospitalares internacionais.
Apesar da importância dos três pilares comuns encontrados, não existe homogeneidade nos protocolos para elaboração de planos de contingência ao nível global. Assim, é importante sistematizar o que existe em comum nos diversos planos de contingência, e fazê-lo de forma contínua, com especial atenção à incorporação dos planos de contingência desenvolvidos em diversos países durante a pandemia da COVID-19.
A sistematização dos eixos principais dos planos e a cooperação entre os diversos países e instituições hospitalares, pode significar um passo importantes para aprimorar e melhorar os planos de contingência e consequentemente, preparar e prevenir a superlotação das instituições hospitalares a nível global em situação de catástrofe, de forma geral e prestar ajuda inestimável a países e sistemas de saúde onde não existem planos de contingência ou onde estes se encontram pouco desenvolvidos.
V. Referências
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Critical Care Team. AACN Advanced Critical Care. 2021 Mar 15;32(1):76–88.
2. Caroselli C. Lessons Learned. A Journey Through Unchartered Territory: A Nurse
Executive's Frontline Pandemic Response. Nursing Economic$. 2020 Jun 9;(0746-
1739).
3. Paiva L. Cruz Vermelha Portuguesa - Início [Internet]. Cruz Vermelha Portuguesa
- Resposta a catástrofes, acidentes e crises; 21 jul 2017 [citado 22 nov 2022].
Disponível em: https://www.cruzvermelha.pt/socorro-e-emergência/situações-de-
excepção/resposta-a-catástrofes,-acidentes-e-crises.html
4. Tomé LM da SD. Plano de intervenção em catástrofe ou situações de emergência
multivítima no serviço de urgência: comumrcaappt [Internet]. 2018 [cited 2022 Nov
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6. Rivera L, Pagaoa M, Maldin Morgenthau B, Paquet C, Angelique M. Molinari N,
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7. Drills on PPE JH. U.S. Hospitals Prepare as Ebola Outbreak Continues.
www.reliasmedia.com/articles/144122-us-hospitals-prepare-as-ebola-outbreak-
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